“O tempo é o senhor da verdade”, sugeriu o senador Aécio Neves (PSDB-MG) como título de um artigo que assinaria. “Não, isso é a marca do Collor, pelo amor de Deus”, respondeu, do outro lado da linha, a irmã Andrea.
A conversa, do último dia 20, dizia respeito à elaboração de texto para um jornal de Minas sobre acusações que o tucano sofreu em delações da Odebrecht.
Junto a outros grampos feitos pela Polícia Federal no celular do tucano, este mostra como Aécio tentava defender seu nome no mês anterior à divulgação de outra delação, a da JBS, que resultou na prisão da irmã e o afastou preventivamente do mandato.
Nas escutas, autorizadas pela Justiça, o tucano aparece disparando telefonemas para discutir o trâmite de seus casos na Justiça, mas também em tentativas de “enquadrar” aliados, como o senador Zezé Perrella (PMDB-MG), e até na busca de uma ponte com o PT de Minas Gerais.
Em 17 de abril, ele ligou irritado para o governador paranaense Beto Richa (PSDB) exigindo que o chefe da Casa Civil do Paraná, Valdir Rossoni, apagasse um vídeo em que cobrava explicações do senador sobre a Odebrecht. “Ou ele arranca isso agora [e diz que] foi mal-entendido ou acabou aí entre a gente.”
Dois dias depois, Aécio reclamou com o deputado petista Gabriel Guimarães (MG) sobre um pedido de investigação feito por um outro integrante do PT no Estado. Disse que o momento “não é para fazer graça” e que cada um precisa administrar “os doidos de cada lado”.
“Entra nesse circuito hoje para ver se baixa essa bola”, disse Aécio, que pediu que o recado fosse dado ao governador Fernando Pimentel, do PT.
Procurado, Guimarães disse que ouve todos que o procuram para tratar de Minas.
ODEBRECHT
Em suas conversas com Andrea, Aécio costumava falar sobre as notícias que saíam sobre ele na imprensa a respeito da delação da Odebrecht –jornalista, a irmã do senador afastado cuidava da imagem dele desde sua época de governador de Minas.
Ele reclama com Andrea que, no artigo que iria enviar ao jornal, se preocupa só em se defender, em vez de propor “agenda” para o Brasil. “Não temos que responder tudo, Andrea, eu acho. Estão respondendo demais”, afirma, em um dos telefonemas.
Ela sugere em outra gravação que ele repense a participação do PSDB na reforma trabalhista, que para ela pode ser “um tiro no pé”.
No início de maio, o tucano defendeu junto ao líder do PSDB no Senado, Paulo Bauer (SC), um “tratamento diferenciado” ao governo Michel Temer. Mas admitiu que nem para a legenda “o mar está para peixe” e preparava uma propaganda que enfatizava a renovação do partido –a peça publicitária de dez minutos, veiculada em 11 de maio, dedicou mais tempo à ministra Luislinda Valois (Direitos Humanos) que ao senador.
PF
Aécio também faz queixas ao diretor-geral da PF, Leandro Daiello, ao telefone. Ele falou sobre o acesso a outros depoimentos em inquérito que responde e diz que um delegado se recusa a fornecer os autos à sua defesa.
Ao falar da delação da Odebrecht com Romero Jucá (PMDB-RR), lamentou a “banalização geral da política”.
Apesar de toda a preocupação com os casos que estavam em andamento, o tucano acabou denunciado pela Procuradoria-Geral da República não em decorrência da delação da Odebrecht, mas da JBS. Apresentada na sexta-feira (2), a denúncia o acusa de corrupção passiva e obstrução à Justiça.
OUTRO LADO
Procurado, Aécio disse, por meio de sua assessoria, que não há nas gravações nenhum “fato indevido”. “Com autoridades e colegas de partido foram tratados temas referentes à atividade parlamentar e partidária”, disse.
A respeito da conversa com Daiello, o tucano afirma que na época já tinha obtido acesso aos autos por decisão judicial e que fez uma comunicação pessoal sobre o adiamento de seu depoimento.